De todos os ritmos oriundos e difundidos pela comunidade
afrodescendente, o Jongo é o que trás características mais marcantes e
identidade indelével. A coluna aborda o tema dando foco a uma personagem
marcante de nossa região. Profissional da área de educação e expoente cultural,
Márcia Fonseca foi rebatizada pela sua militância e hoje o AfroSom tem a honra
de entrevistar Márcia do Jongo.
Márcia do Jongo em um vicênvia Griot |
Afrolagos - Para Marcia Fonseca, o que é o Jongo?
Marcia Fonseca -É uma forma de culto aos meus, aos nossos
antepassados.
Afrolagos - Como o Jongo surgiu na
sua vida?
Marcia Fonseca
- Comecei desde pequena, por incrível que pareça... fiz balé clássico durante
muito tempo, curso profissionalizante, e neste curso havia muitas disciplinas,
uma delas era folclore nacional prático e teórico, outra como o Afro (contemporâneo e de orixá). Foi aí que eu
entrei em contato com a cultura brasileira, e me identifiquei com a cultura afro.
Conheci o jongo e outras danças e amei !!! Os anos passaram e eu fui para a
faculdade de educação física (UFRRJ), tive contato com vários grupos de danças
folclóricas e de cultura popular nas minhas andanças acadêmicas... como sou
carioca, nascida e “vivida” no Rio, tive a oportunidade de conhecer o mestre
Darci, comecei a escutar muita coisa de samba, onde o Jongo ou Caxambu é sempre
lembrado. Foi quando eu conheci uma galera do Jongo da Serrinha/Grupo Brasil
Mestiço e o Pau da Graúna... e com eles o Jongo, Lundu, Ciranda, Coco, etc.
Afrolagos - Qual a importância do Jongo na sua história?
Marcia Fonseca
- Foi o despertar para várias questões... questões inerentes ao UNIVERSO do
Jongo. Fatores históricos, sociais, econômicos, políticos, e por que não dizer,
espirituais, importantes para o meu crescimento pessoal e profissional. Uma
fonte muito rica de conhecimento que proporciona muita satisfação profissional,
ensinando e difundindo-o na rede pública de ensino de Cabo frio, e em Arraial
do Cabo com o projeto GRIOT. Entre as diversas manifestações tradicionais, o
Jongo é o que mais me sensibiliza, o que mais me faz transcender... Esses
fatores mudaram meu rumo profissional, minha história...
Afrolagos - Em nossa região, como vem sendo tratado o Jongo?
Marcia Fonseca - Poucas pessoas
conhecem o Jongo... e na Região dos Lagos menos ainda... Falta
TRADIÇÃO. Faltam grupos de Jongo, faltam rodas de Jongo, faltam pesquisas em
história do negro na região, suas tradições, costumes, manifestações, etc.
AfroSom - Existe algum fato marcante na sua relação com
o Jongo, passado em nossa região que você queira registrar?
Marcia Fonseca - Quando os meus
amigos Jongueiros vieram do Rio e o Anderson, Lazir e Cátia do Jongo da
Serrinha vieram para o “IITAMBORES DOS ANJOS” em junho de 2011, e em Arraial do
Cabo.
Afrolagos - Que ações poderiam ser executadas na região
para a preservação deste patrimônio cultural que é o Jongo?
Marcia Fonseca - Incentivar, promover, desenvolver, apoiar
atividades ligadas ao Jongo nas redondezas, e é isso que é difícil. Falo por
que as pessoas se deslocam pouco por aqui. Dizem que adoram o Jongo, mas não
aparecem. Pessoas que conheçam os cantos, percussão, as danças... a TRADIÇÃO e
a HISTÓRIA do Jongo. O Jongo não se aprende de um dia pro outro, o Jongo é
muito mais que dança, percussão, canto... É um compromisso de respeito aos
nossos “mais velhos”, é um compromisso com as raízes africanas,... não vejo
esse compromisso por aqui... e compromisso não se aprende! Assim como não
conheço pesquisas nessa área, relacionados à Região dos Lagos, principalmente
Cabo Frio e Arraial do Cabo. Existem indícios que em tempos passados, tinha Jongo
nos quilombos, mas esses perderam a sua memória... Recuperar a memória e
difundir, são ações essenciais!
Afrolagos - Todo o preconceito contra as manifestações
culturais de origem africana também atingem o Jongo?
Marcia
Fonseca - Sim, com certeza! Em muitos lugares a cultura de raiz
africana é condenada, não reconhecida pelos próprios negros. Na maioria das
vezes é chamado de “macumba” (pejorativamente)... em muitos lugares da região
existe a prática de “ditadura religiosa” por parte de muitos “evangélicos”... Vivi-se
uma verdadeira perseguição por tudo que não for “gospel”, uma espécie de caça
às bruxas... rsrs. Sinto-me assim na minha prática docente diariamente, mesmo
com a lei 10639/2003, em relação às disciplinas Capoeira e Danças populares
brasileiras, que são condenadas por responsáveis de alunos junto com seus
líderes religiosos; e sempre pelos mesmos motivos: “Que não pode fazer as aulas
por que são da igreja”; “Porque a missionária disse que não era pra fazer”;
“Porque o pastor disse pra não fazer”, “Que não é de Deus as nossas danças
populares”, etc.
Afrolagos - Qual a mensagem de Márcia
Fonseca para a Comunidade AfroLagos?
Marcia Fonseca - Incentivar,
promover, desenvolver, apoiar atividades ligadas à cultura popular brasileira,
com ênfase na raiz africana, afro brasileiras como o Jongo, Coco, Maracatu, Samba,
Samba de roda, Tambor de criola, enfim ações nas atividades de afirmação como
mostra de filmes, concurso de beleza, um combate mais ostensivo à discriminação
e preconceito étnico racial, sua cultura sua história.
Entrevista concedida ao Jornal AFROLAGOS em Julho de 2011
Fotos: Acervo Griot
O Jongo irmanando e congregando as comunidades |
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